Chave




 Pequena garota, o que há na sua mente?

 De todas as coisas que voce fez , qual é a que mais se arrepende?

Do abraço não dado, da palavra não dita;

Do beijo nao solicitado; do aperto não lembrado.


E você sabe bem, que arrependimentos são passado;

quando o agora é o que mais importa é viver bem.

Se vive, se experimenta, arrisca e sente.

Se arrepende por ter feito e nao feito.


Pensa que amanhã pode nao estar aqui,

entao decide arriscar, fazer e sentir.

Quer o amor que não teve, 

as viagens que o medo nunca deixou,

os filhos que nunca quis,

o casamento que nunca foi desejado até ser.


Até encontra-se sob o jardim 

e perceber que nao temos todo o tempo do mundo.

O tempo passa: tic-tac; tac-tic.

Não decidiu por si, mas resolve partir.


Descobre que quer ver as lavandas nos jardins infinitos,

Conhecer culturas diferentes e ver a humanidade de novo.

Novamente, experimentar sensações diferentes.

Mesmo que sozinha, de repente.


Tatua no corpo e dessa vez, encara sempre.

As novas marcas, as cicatrizes antigas;

O coração que desfalece e renasce.

A mente que regenera e a chave gira.


Encaixa e abre a porta trancada.

Agora, entreaberta. E o que vem com ela,

É novo, é desconhecido e tem gosto de casa.

Com ela, os campos sao grandes, floridos;

E no meio, tem espinhos.


Desbrava como uma criança que sempre foi:

Atrapalhada, curiosa e risonha.

Cai e ri; Machuca e levanta; 

É destruída e nasce.


Renasce como novo.

Das cinzas ao renovo.

Do cinza ao colorido, como era para ter sido.

Acompanhada ou sozinha. 


Aventurando da Argentina a China.

Do frio ao calor; do gelo ao fogo.

Do extremo ao oriente.

A chave que abriu tudo o que pode ser 

É a mesma que a faz sentir como gente.




E se

0402



 Se minha mãe soubesse a bagunça que se encontra em mim, ela nunca mais reclamaria de como está a casa. Se meu pai sentisse minha tristeza, ele provavelmente dormiria do meu lado, para que eu não me sentisse sozinha.


Se as pessoas soubessem o quanto tenho me esforçado para continuar me levantando, me poupariam de palavras tolas e brincadeiras duras. Só eu sei o quanto é insuportável lutar contra a própria mente para nao jogar tudo para o alto.


Se minhas amigas soubessem que meu coração dói a qualquer hora, mesmo tentando me distrair. E que meu silencio significa a dor no peito, me dispensariam de certas conversas e me consolariam.


Se minha irmã soubesse que o quarto tem sido meu refugio diario e de alguma forma me sinto mais protegida, provavelmente me julgaria, porque existem verdades nele que não quero ver.


Se meu terapeuta soubesse que a única hora que sinto vontade de gritar e chorar é com ele, ele provavelmente deixaria. Deixaria que eu chorasse e dividiria sua halls de morango comigo. Pegaria na minha mão e me perguntaria porque ainda estou me culpando, com razão.


Se eu pudesse ser apenas observadora de tudo o que sinto e penso, provavelmente me salvaria de situações e do vácuo que sinto dias sim, dias não. Em que há lutas dentro de mim e algo falta. O vazio persiste mesmo nos "E se ".


E se nesses se, hão de existir os sentimentos que todos sabemos, mas preferimos ignorar e fingir que não estão ali, mesmo quando são muros ao nosso redor.


Gestos



 Te vejo rindo da piada, mas quem consegue te ver, sabe que não há nada de engraçada. Abraça seu próprio corpo na tentativa de sentir-se segura, em casa. E quando chega, deita-se na cama, aliviada pelo silencio do escuro, apenas com o barulho da chuva que traz recordações que voce nao quer lembrar.


No eu te amo mais sincero; no amor da minha vida dito, voce sorri, mas desacredita tanto que sua alma parte , sem de fato ir. No abraço de lado ou no mais apertado, entende que muitos "eu te amo" sao ditos nos gestos mais vulneráveis. Na coragem de dar sem saber que será retribuído. Do olhar cumplice que conta muito sem nada dizer.


Do corpo que conta a história por voce. Pela escuta sem julgar ou depreciar; pelo falar duro, que depois se arrepende e tende a perdoar, sem nós colocar em apuros. Das brincadeiras que nos levam a risadas altas e olhares maliciosos e impuros.


Da pergunta : " Voce está bem?" e sem disfarce, dizer que está indo, mas quase lá. Os olhos ameaçam uma neblina, mas disfarça de novo e ri, porque chorar nao é opção em publico. Guarda para quando estiver sozinha. E deixa-se vazar de lugares lotados e pessoas vazias.


 Permite que o tempo te dê as respostas que precisa, mas não implora para tê-las. A história continua sendo contada com vidas sendo geradas, com algo bobo que foi compartilhado, com o abraço de uma senhorinha que não descansa enquanto voce nao a sorri.


Traz o café, senta ao seu lado e conta a sua história para que lágrimas possam serem adiadas. O ar torna-se ameno por instantes, distante por horas. E quando percebe que há bem nos detalhes, amor escondidos nas entrelinhas e cuidado de pessoas que nem te conhecem direito.


E é nessas vezes, que acredita que existe amor e com ele a força se renova, o sorriso volta e os sonhos... Ah, esses voltam a florescer. Capitulo a capitulo ganham força, moldando a essência que nunca se perdeu.
 

Ressurreição

2303

 Se houvesse prece a ser feita, ela já foi feita. Se existe culpa para ser assumida, ela já foi condenada. Se houvesse julgamento, ja estaria presa. Não há mais força para afrontar. A coragem de tentar e arriscar é a montanha-russa da rotina.


Nem todos os dias eu consigo, mas em todos tento. Persisto na linha de frente, colocando a cara a tapa, deixando meu coração no escondido. Levanto o escudo, mas deixei a espada em casa. Guardei-a porque não sei afrontar , só me defender. 
Crio a defensiva, me protegendo dos dias maus que agora são solitários e não há onde desabafar.


Não me curvo, não avanço, mas também não batalho. Levanto, mas quem tem o coração blindado, deixa a mente ser flechada nas altas emoções. O escape é ausente. Do céu recebo a proteção, das estrelas vem a pretensão de dormir e acordar acreditando que dias melhores virão.


Enfrentando novos gigantes, inimigos de caminhos diferentes, combatendo o combate da nova estação. O que antes não fluía, flui mais no secreto. E posso ter sido esquecida, mas continuo debaixo da nuvem. Levo meus olhos aos lugares altos. Encontro abrigo e a única confiança sobrevive.


Sobrevive no pior tempo, no mais dificil presente com o futuro inacabado. Fecho os olhos e vou caminhando, segura, sem ninguem ao meu lado. O inicio e o fim das coisas, no meu primeiro e ultimo suspiro. O brilho dos meus olhos sonha em ser a fonte de cuidado quando houverem temporadas de inverno. 


No lugar secreto, justifico em silencio, no mais alto sentimento. Confesso meus pecados, me perdoo e perdoo os outros. Digo o que desejo e insisto em acreditar que não sou estranha por guerrear sozinha.

 Ninguém deveria até ser obrigada a ser. E eu morro tantas vezes como Clarice Lispector, experimentando as ressureições da vida.

Presença secreta

 


Os portões são abertos das 6 as 21. Deixo que visitem seus entes queridos, como se tivesse algum poder para barrar que tragam flores, que chorem sob a terra ou fiquem em silencio no meio da morte. Me encontre nos túmulos das pessoas que perdemos, dos amores rejeitados, da solidão que perdura e da tristeza que antecede nossos olhares.


Há muito a se dizer quando se vai. E se vai de maneira repentina, dói ainda mais. É como se tivéssemos todo o tempo do mundo, mas o amanhã é tão incerto que não percebemos que para alguns ele acaba. 


O tic-tac biológico dá os ultimos suspiros. De repente para poucos, demorado e doloroso para outros. Duro para quem ver de fora, mas que chora por dentro a dor que não é sua, mas rezou para que fosse.


Vê o túmulo e as palavras que dizem algo querido. Os ossos virarão pó e o seu pedido ao vento será entregue. Se a crença for suficiente, o céu mostrará que acredita. Se demora, mas ao demorar escuta o choro desesperado de uma mãe que perdeu o filho; do pai que não acordará mais; do irmão que nunca mais sorrirá; da criança que não viverá a infância; dos avós que nunca mais escutará conselhos. 


Perdeu e se perde, mas segue. Entra no seu mundo, mas os ruídos continuam lá. Seus pés fincam na terra firme quase como se perdessem força para sair do lugar. Deixa-se ir. As flores continuarão na terra e murcharão sem ninguem para cuidar. Dê água fresca para elas, que na morte desabrochem vida. 


E voce pensa que uma pessoa não pode ser apagada, nem mesmo as lembranças. Cruzam nosso caminho e mesmo com a morte, permanecem presente nos vivos. E se houver algo para se acreditar, de onde estou sinto a ausência secreta, que não é mais do que sua presença na minha mente. Voce não está mais aqui, mas continua em todos os lugares que passou e ficou.


Ao contar que viveremos perdendo uns aos outros pelo resto das nossas vidas, fico em duvida se aguentarei perder quem amo. Se os sonhos vividos significam algo; se do céu você olha por mim de alguma forma. Se na distancia, seu amor ainda vive e nem a morte, nem as barreiras romperão com isso.


É um longo caminho de ganhos e perdas. E quando os olhos fecham, uns são apagados definitivamente , mas nunca das lembranças de quem os têm.

Ela foi.

0903

 Ela é sobrevivente das histórias que não conta, mas vive nos seus dias sombrios. Não sabe se superou porque a violação corrói seu corpo. A mordaça foi colocada cedo demais, segurando sua voz, embalando seu choro. 


Falou adeus a si mesma quando a tocaram. Brincou de esquecer, mas escalou a janela mais alta da torre. Jogou os pés para fora e vendo o céu estrelado, fingiu que se morresse, não havia problema recomeçar em outro lugar. Mas, que desgraça seria viver e respirar.


Embalou mil lençóis para que não escutassem as memórias invadindo seus pensamentos quando ela só queria esquecer. Ficou no escuro até se acostumar que a escuridão faz parte de si. O lado sombrio que a deixa só existindo, sem querer , de fato, existir.


Deixou-se seguir, porque não havia opção a não ser partir. Ir embora para longe da casa amarela. Construir muralhas ao seu redor para que ninguem chegasse. Não a toquem, não a amarrem, não a beijem. E ela insiste que deu adeus as trevas.


Goodbye e se reconstruiu. Abraçou os vinte anos, tornando-se a melhor versão de si. Como um lobo solitário, prendeu-se a si mesma. A sua única ancora que a permitia seguir. Não era o amor, era uma tentativa insistente de nao desistir.


Mesmo quando as sombras a perseguiam, ela lutava para estar aqui. O odio de sentir, a repulsa dos toques, os pensamentos intrusivos. O poder de não pertencer a destruía até entender que não existe conserto para algo que já está quebrado.

 

O que quebrado está, assim vai ficar. Cicatrizes nao somem com o tempo, só passam despercebidas. Silêncio que ela vai partir de novo. Mas, não a deixem ir de novo. Se ela for, dessa vez não voltará a si. Dê-lhe motivos para ficar e liberar o que está guardado.  Feche os olhos para a sentir, mas os abra novamente para o que vem a seguir.


Bia - mora em João Pessoa, PB. Fisioterapeuta, instrutora de pilates e amante da literatura. Sempre foi amante de livros desde criança e em 2014 criou o Blog Meu Coração Literário para compartilhar sua paixão pela escrita e pela leitura.




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